quinta-feira, 10 de março de 2011

Solidariedade imoral

Quando você ajuda alguém, quem você está ajudando? Esse questionamento paradoxal é muito mais pertinente do que o “por que ajudar?”, pois este busca um motivo para beneficiar o outro, enquanto que aquele revira um local muito mais importante: o eu de quem ajuda.

Não vou entrar no mérito de falar das solidariedades com segundas intenções, já que essas são imorais por natureza e até mesmo antiéticas. Já que este blog não tem nada de antiético, vou falar daquelas que aparentemente são apenas benéficas, que parecem não esperar volta e não são obrigatoriedades de profissão. Por exemplo: salvar alguém de um afogamento, dar uma cesta básica a quem necessita, fazer trabalho solidário em locais vítimas de catástrofe, entre outros casos. A semelhança entre as pessoas que fazem esse tipo de serviço com a dançarina que vai para o concurso de “rebolation” são muito maiores que a aparência. ... .

Começando pelo “rebolation”, tanto a dançarina como os bons samaritanos buscam a mesma coisa: aplausos do público que a observa. Obviamente os aplausos da mulher com o belo corpo são os físicos (isso mesmo: clap, clap, clap), enquanto que os dos bondosos são os comentários de aprovação e reconhecimento. A diferença é a música que eles dançam: uma dança o hit do momento, enquanto que os outros dançam com os problemas do momento. Mas muito além do reconhecimento, os benfeitores tem uma desvantagem com relação à dançarina: muitos deles (para não dizer quase todos) se sentem superiores tanto a quem foi ajudado quanto a quem não ajudou. Se achar melhor porque teve condições ou vontade de ajudar é de grande imoralidade, mas dificilmente esse sentimento é detectado por alguém, inclusive pelo próprio homem solidário. No caso deste, a superioridade costuma ser confundido com “satisfação em ajudar”. De fato, ambos os sentimentos trazem boas sensações, o que justifica o engano. Portanto quem é solidário muitas vezes está apenas buscando alimentar sua superioridade para se sentir bem, ou seja, ajudando a si próprio a manter autoestima (já observou que a maioria dos bondosos são indivíduos de pouco destaque entre as pessoas?). Como o benefício maior é interno, nem sempre é necessário ter reconhecimento externo, ou seja, nem sempre a pessoa sente necessidade de outras pessoas ficarem sabendo de que ela praticou atos solidários. Entretanto, o fato de colaborar em algo sem outras pessoas saberem também ajuda no sentimento de superioridade, pois esse tipo de atitude é mundialmente rotulada como boa. Mas muitas vezes, o sonho desse bom samaritano é as pessoas descobrirem por acaso que ele fazia esses serviços. Eu já disse que é por acaso? A dançarina também pode compartilhar desse sentimento de superioridade, mas não chega ser imoral porque ela está em uma competição, oras.

Contudo nem sempre a imoralidade da solidariedade reside no sentimento de superioridade. Ao fazer boas ações para contribuir com sua própria autoestima ou apenas para se sentir bem também não escapa de certa dose de imoralidade. Uma mãe que tira um espinho de seu filho que chora está o ajudando ou o fato de ele estar com o espinho a incomoda e por isso retira o acúleo? O que observamos é apenas uma coisa: filho chora, mãe o ajuda. Nunca saberemos as intenções daquela mãe. Nem ela mesma. Será que se ele não chorasse e nem avisasse que tinha um espinho, ela iria observá-lo e procurar por espinhos no garoto? Iria retirar espinhos que o próprio menino nem sabia que estavam encravados? Essas não são perguntas retóricas. Imagino que algumas sim, outras não...ou então às vezes. Quantas dessas vezes seriam para ela mesma se sentir bem (uma vez que o filho fica bem), impossível mensurar. Enfim, imoral.
Talvez, então, as melhores boas ações (não as mais importantes) sejam aquelas que se ajuda e não se sente nada por isso. Nem melhor, nem pior. Apenas fazer. Da mesma maneira quando se cede uma posição no trânsito ou não se esforçar para chegar antes que alguém na fila ou ainda quando deixa o resto de bebida para a companhia. Ação pela ação e não por educação (parte importante).
Tudo isso também não significa que as grandes benfeitorias não devam ser praticadas, pelo contrário. Bem que mais pessoas poderiam estar precisando alimentar sua autoestima...



Infelizmente, depois desta reflexão passei a observar que as solidariedades mais importantes talvez sejam as mais imorais. Não sei se devo ajudar as pessoas a enxergar o mundo de forma diferente. Ainda resisto em praticar essa boa ação... acho que vou deixar o texto no meu notebook.


imoral, Reflita.

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